TEATRO DO TÉDIO

[pensamento]
Muito se fala sobre os contemporâneos e a capacidade de reinvenção dos grupos que correm atrás de investigações ousadas e vanguardistas, pós-dramáticas e performáticas. Queremos dizer muito e na ânsia de diversas linguagens herméticas e pouco comunicativas, acabamos por não dizer nada. O que seria um teatro da experiência, torna-se um libelo à chatice e ao egocentrismo do artista cênico.
Me pergunto: o que fazer? Ontem assisti um espetáculo pequeno no espaço Satyros em São Paulo, na enigmática Praça Roseveld, e sai de lá com uma sensação de que estamos andando para trás e tudo que vejo atualmente me cheira a tédio e a empacotamento artístico. No caso desse espetáculo, foi evidente que ele não está nivelado em relação às produções que atualmente estão acontecendo em São Paulo dos diretores Antunes Filho, José Celso Martinez e Cibele Forjaz, que empreenderam e continuam a causar estremecimentos nas linguagens cênicas. Mas fora isso, sobre a grande maioria das produções, o que me causa um incômodo explícito no teatro brasileiro é uma sensação de trabalhos que são legitimados pelos privilégios e "bairrismos" de cada nicho artístico e não reconhecidos objetivamente pela recepção do público.
Cada vez mais nos especializamos, e a maioria diz que faz e sabe o que é perfomance, por exemplo...
O teatro por um lado tem uma função social e por outro mantém seu caráter de experimentação de linguagens... A conversa é sempre a mesma: blá, blá...
O que fica é que todo mundo trabalha como um cão e poucos recebem a taça! Acontece um processo de tremenda chatice nos meios teatrais, que tem conseguido aterrar toda a dimensão criativa e maravilhosa da troca espontânea com o público, aos vôos de corpos vivos em ação ou palavras dançando e envolvendo nosso imaginário. Acho mesmo: Teatro é teatro e chatice é chatice. Muitos dizem que sempre será assim e que os privilégios sempre existirão. Pois eu cansei de aceitar esses "sempres" do teatro. Querer é mudar. Chega desses conflitos pequenos burgueses. Chega do teatro do umbigo. Todo mundo fala, mas tem receio de escrever. Pois tá aí o meu dizer: chega do teatro do tédio!
meu abraço aos artistas e ao público,
Letícia Andrade.
1o Junho de 2010, no aeroporto lotado de guarulhos.






Meu amigo Clécio Luiz me disse, respondendo:
Participo da sua ideia. Há pouco, e tem sido assim, fui assistir a um espetáculo de teatro. Sabe o que achei? Teatro, na sua expressão mais plástica, exagerado, grandiloquente, canastra.
O desejo de expressão tem sido tão grande, as coisas a se dizer são tantas, e isso é muito bom, mas o artista não tem encontrado o caminho ou a ferramenta mais adequada para se manifestar. Com isso, o que tem o ocorrido é uma farofa de linguagens. Muita informação, muita coisa que não precisa estar em cena, muita cor, muita fúria e quase nada de novo, de inquietante. O resultado é o que você chama de tédio: apenas 20 minutos se passaram mas, parecemos estar a a 50 sentados na platéia. Um sem fim de formas engrossam tanto a comunicação que ela já não passa pelos "ouvidos". Muito barulho por quase nada.
Outro dia comentei com uma amiga que algumas produções de teatro têm mais apelo artístico em seu material gráfico de divulgação, do que na obra em si, ou seja, mais me agradou ver o trabalho do artista gráfico do que ver o espetáculo de teatro que estava bem aquém de sua imagem, sem qualquer semelhança. Resultado, tédio. Comprei peras, chupei melão. Detesto melão.





Meu amigo Igor Ayres, também participou desse debate:
Olá Letícia!
Acho muito apropriado o texto e venho refletindo sobre o assunto já há algum tempo.O tal "teatro tédio" tem uma ótima (e engraçada) análise no programa Cilada. São três partes, mas acho que vale a pena dar uma conferida. É comédia que faz pensar (o melhor tipo!)
Abraço,Igor.

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